Por Plínio Guimarães e Severino Carvalho
A atividade turística tem sido uma das mais atingidas pela pandemia da Covid-19. Entretanto, ela é caracterizada por uma forte segmentação, não havendo, dessa forma, impactos negativos padronizados nos diversos estratos que formam o setor. Alguns deles estão sendo mais atingidos, outros menos.
O aumento do turismo receptivo internacional, por exemplo, tem sido um desafio que vem acompanhando os gestores no país. Em 2014, pela primeira vez, a chegada de turistas ao Brasil superou a marca do 6 milhões em um ano, impulsionada, sobretudo, por eventos grandiosos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas.
Desde então o número de turistas estrangeiros visitando o país vem variando na casa dos 6,5 milhões. Um número ainda muito baixo para um país de dimensões continentais e detentor de uma diversidade de atrativos extraordinária. Mas, se o número de turistas estrangeiros no país era considerado baixo, com a chegada da pandemia da Covid-19, sentiremos saudades desses números nos próximos dois anos, na melhor das hipóteses.
Diante deste cenário, o Blog da Costa dos Corais procurou um dos grandes profissionais do turismo brasileiro, com larga e diversificada experiência: Eduardo Sanovicz. Ele falou não apenas da situação do mercado turístico receptivo internacional, mas também sobre outros temas importantes, que envolvem a atividade turística no país e na região da Costa dos Corais, como o processo de retomada, a implantação dos protocolos sanitários e o novo normal.
Professor com doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP), Eduardo Sanovicz é presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (ABEAR). Ele foi presidente da EMBRATUR (2003 a 2006) e do Anhembi Turismo e Eventos da Cidade de São Paulo (2001 a 2003), dentre outras inúmeras experiências como gestor na atividade turística desde 1993.
“O novo normal será um tempo em que as viagens vão mudar, principalmente, a dimensão da relação de cada um com o tempo”, afirmou.

Blog da Costa dos Corais – Iniciamos a entrevista tratando exatamente do órgão responsável pela promoção internacional do turismo brasileiro, a EMBRATUR, agora transformada em Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo. No momento em que há essa importante mudança, voltada exatamente para a conquista do tão desejado aumento no fluxo de chegada de turistas internacionais, a pandemia da Covid-19 atinge fortemente o mercado externo. Durante a sua gestão como Presidente da EMBRATUR, de 2003 a 2006, aquela autarquia tinha outra forma de atuação. Como o senhor avalia a transformação feita na Embratur?
Eduardo Sanovicz – A transformação que ocorreu na Embratur é extremamente positiva. Um dos grandes méritos e legados que ficarão na gestão do presidente Gilson Machado Neto e do ministro do Turismo Marcelo, Álvaro Antônio, é o de terem concluído com sucesso um debate que teve início há 15 anos. A primeira versão do projeto que transforma a Embratur de autarquia em agência foi durante a minha gestão como presidente. Esse debate começou inspirado lá em 2005 pela transformação que havia sido feita no Turismo de Barcelona, que eu tinha conhecido nos anos 90. E esse debate se arrastou por todo esse tempo, portanto, creio que ele é positivo e meritório e fica para a história da Embratur e do Turismo brasileiro como uma mudança de muita qualidade.
Blog da Costa dos Corais – De que forma a Embratur pode ajudar na retomada da atividade turística, mesmo com o consenso de que o turismo regional será o carro-chefe desse recomeço pós -pandemia?
Eduardo Sanovicz – A Embratur tem hoje um quadro técnico, um conjunto de profissionais, expertise e estrutura que pode somar-se ao processo de retomada do Turismo regional. Acredito que as lideranças da Embratur e do Ministério devem estar envolvidas nesse debate, pois a grande ajuda no atual momento é focar um pedaço de seu tempo, energia e orçamento nesses primeiros meses pós-pandemia no tema nacional e regional. Num segundo momento, voltar às ações de promoção internacional que são e serão um desafio enorme.
Blog da Costa dos Corais – Na Europa, vários países estão investindo na retomada a partir de corredores turísticos ou bolhas de viagens. Qual a sua opinião em relação a essa estratégia. Ela poderia ser aplicada na região da Costa dos Corais?
Eduardo Sanovicz – Eu não estou muito seguro quanto a esse conceito de bolhas, porque você teria de partir de pressuposto de que não há mais nenhum tipo de caso e risco de contágio do novo coronavírus. E hoje, do ponto de vista técnico e gerencial, nós ainda não podemos fazer essa afirmação. O que eu acredito e que é absolutamente vital é apostarmos nessa retomada assim que tivermos segurança dos protocolos sanitários junto aos públicos que estão mais próximos aos polos promotores. Nesse sentido, eu traçaria um raio de viagens de até 2h30 ao redor da região e a partir daí traçaria uma estratégia para eventos associativos, corporativos e outra parcela para lazer, feriados e datas especiais.
Blog da Costa dos Corais – Não resta dúvidas que a segurança pessoal do turista, especialmente a segurança sanitária, por meio da aplicação de protocolos, tornou-se decisiva na escolha de qual destino visitar. Em sua opinião, como os destinos deverão se organizar para conseguir conciliar a atratividade turística com a segurança sanitária?
Eduardo Sanovicz – Venho acompanhando o debate de uma série de setores a partir das discussões que a própria aviação está fazendo. No nosso caso, criamos um conjunto de normas, sob supervisão da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), ouvindo os nossos profissionais médicos e também da IATA (sigla em inglês de Associação Internacional de Transporte Aéreo) e da ICAO (sigla em inglês da Organização da Aviação Civil Internacional), que são as duas organizações internacionais de aviação. No nosso caso, a mesma regra vale do norte ao sul do país e também internacionalmente. E a nossa atitude tem sido a de divulgar para milhões de consumidores, por meio de nossas ações de Comunicação na ABEAR, mas destacadamente em cada uma das empresas aéreas que normas, regras e práticas são essas. O grande desafio que todos nós temos é o da educação, de nossos colaboradores e parceiros e, principalmente, dos consumidores para uma série de procedimentos que vão ficar por muito tempo como parte do nosso cotidiano.
Blog da Costa dos Corais – Como o senhor avalia o programa Turismo Responsável, Limpo e Seguro, lançado recentemente pelo Ministério do Turismo?
Eduardo Sanovicz – Todo o Programa que o Ministério do Turismo conduziu foi bastante bem articulado, pois dialogou e debateu com os diversos setores. Eu mesmo conversei com o secretário nacional de Integração Interinstitucional do ministério, Bob Santos, sobre isso e eu não tenho dúvidas de que é um programa da melhor qualidade, a ser aprofundado, debatido e traduzido a partir da realidade de cada um dos segmentos que compõem a atividade turística. Creio que é um norte e agora cabe a cada setor, a cada entidade, a cada produto e a cada empresa em qualquer lugar do país extrair dali as melhores lições e possibilidade para gerar segurança para os seus colaboradores, para a sua cadeia produtiva e para os seus clientes.
Blog da Costa dos Corais – Como as empresas aéreas poderão contribuir para a retomada do turismo em destinos como Porto de Galinhas, Maragogi e outros da Costa dos Corais?
Eduardo Sanovicz – As empresas aéreas contribuem na medida em que conseguem retomar, a partir de sinais que o setor tem, de que a Economia começa a voltar e a demanda começa a aparecer, para que seja possível retomar os voos que foram cancelados. Como todos sabem, a nossa demanda por voos domésticos caiu 93% e a por viagens internacionais foi reduzida a zero. O nível mais baixo de voos diários que tivemos foi de 180 ao fim de abril, 263 em maio e chegaremos a 353 no fim de junho. E esperamos que esse processo de retomada se dê de também de forma vigorosa nas regiões de lazer mais importantes do país, entre elas a região entre Pernambuco e Alagoas, que é uma das mais bonitas e atrativas que nós temos.
Blog da Costa dos Corais – Os profissionais do Marketing estão começando a adotar o termo o “novo normal” em substituição ao termo pós-pandemia. Como o senhor descreveria as características desse novo normal na atividade turística?
Eduardo Sanovicz – Esse novo normal será um tempo em que as viagens vão mudar, principalmente, a dimensão da relação de cada um com o tempo. As pessoas vão se dedicar bastante em análises e ponderações para definir como utilizarão o seu tempo quando estiverem viajando. Com isso, vão parar de passar correndo pelos lugares, evitando conhecer destinos superficialmente porque nós vamos ter, num primeiro momento, a retomada de demandas regionais. Depois disso, virá a procura por destinos nacionais, latino-americanos, continentais e intercontinentais. Em cada uma dessas etapas, como tudo vai depender de protocolos sanitários e de novas formas de convivência, quando as pessoas tiverem em ambientes seguros e que possam usufruir, vão realmente parar para aproveitar. Portanto, isso significa também que os produtos, os serviços, os destinos e os equipamentos têm que procurar criar esse ambiente sempre que possível para que possam desfrutar com mais competência e efetividade os clientes que teremos agora nesse processo que se avizinha.
Mais sobre Eduardo Sanovicz
É mestre e doutor em Ciências da Comunicação pela USP, graduado em História. Atualmente leciona no Curso de Turismo da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (USP). Já atuou como Consultor-sênior em Programas e Ações em Marketing e Turismo. Foi Diretor da Reed Exhibitions Alcantara Machado, de 2007 a 2011. No período de 2003 a 2006, foi Presidente da EMBRATUR, quando implementou o Plano Aquarela e criou a Marca Brasil. Esteve à frente da vice-presidencia da International Congress & Convention Association (ICCA), de 2001 a 2007. De 2001 a 2003, presidiu a Anhembi Turismo e Eventos da Cidade de São Paulo. Foi ainda Diretor de Operações do São Paulo Convention & Visitors Bureau, no período de 1997 a 2000, e Diretor de Turismo da Prefeitura Municipal de Santos, de 1993 a 1996.