Matérias jornalísticas podem possuir caráter educativo, falar de denúncias, enfim… Esta aqui, que escrevi para as páginas da Gazeta de Alagoas, edição do dia 6 de dezembro, é um alerta, que agora posto na íntegra no blog e com mais alguns detalhes.
Abaixo, a primeira matéria. Boa leitura!
O belo e singelo conjunto arquitetônico da pequena Porto de Pedras, no Litoral Norte de Alagoas, sucumbe à falta de políticas públicas de preservação e à ausência de educação patrimonial. Aos poucos, a marreta da insensatez vai demolindo pilares, fachadas, casas inteiras construídas entre os séculos 18 e 19.
A mão pesada do descaso também faz ruir um prédio público erigido em 1633, tombado pelo governo do Estado em 2006, mas que ainda aguarda por uma pá de salvação.

“É lamentável que isso esteja acontecendo. Porque esse conjunto arquitetônico representa uma fase de desenvolvimento socioeconômico e cultural daquele lugar. Quando ele desaparece, perde-se uma referência, porque arquitetura é um discurso que fala de épocas e de contextos sociais”, declarou a professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Josemeiry Ferrare.
Em 2005, ela coordenou um projeto de extensão desenvolvido com alunos da disciplina de Prática de Restauro, cujo objetivo era elaborar um inventário arquitetônico de Porto de Pedras voltado à execução de ações de preservação e de educação patrimonial, entregue à Secretaria Municipal de Cultura. O trabalho catalogou cerca de 70 unidades habitacionais com potencial arquitetônico na cidade de Porto de Pedras e outras 20 no povoado de Tatuamunha.
“São exemplares de interesse histórico arquitetônico. O casario de Porto de Pedras se caracteriza, predominantemente, por casas térreas de porta e janelas, adornadas por beirais singelos ou platibandas com adorno em massa com florões, estrelas e elementos geometrizados ou vazados. Encontramos também casas com terraços laterais com colunas de embasamento alto em madeira ou alvenaria. Há ainda construções com influências neoclássica, eclética e modernista dos anos de 1960, que também são importantes”, descreveu a professora.
Uma década depois…

Dez anos depois do inventário, nada ou quase nada foi realizado pelo poder público no sentido de preservar esse tesouro. Paulatinamente, o patrimônio vai se esvaindo aqui e acolá. A Rua Vigário Belo guarda dois tristes exemplos. Por sobre a via de paralelepípedos, foi posta uma camada de asfalto. O piso de calçamento fazia parte do cenário interiorano da pequena cidade com pouco mais de 8 mil habitantes.
Ali havia, até outubro do ano passado, um casarão que datava de 1890, pertencente a uma tradicional família de Porto de Pedras. O imóvel, inventariado, foi vendido e a nova proprietária, a comerciante Jaqueline da Silva Santos, o colocou no chão. No local, ela ergueu um ponto comercial, onde funcionará, em breve, um mercado.
“Para fazer um ponto comercial não tinha como eu manter a casa daquele jeito, até porque eram umas janelinhas e, assim… Era toda de taipa”, disse a comerciante, afirmando que, em nenhum momento, foi procurada pelo município ou por qualquer outro órgão público durante a demolição.
Para justificar o ato, ela cita o caso, ou melhor, o descaso com o prédio do antigo forte, edificado em 1633, e que já funcionou como Cadeia Pública.
“A delegacia (Cadeia Pública) está aí: caindo aos pedaços e ninguém faz nada”, comparou Jaqueline, que diz não ter sentido nenhum remorso ao botar no chão o antigo casarão.