Em 2008, escrevi o artigo abaixo acerca do aleijão em que se transformaram os sistemas de tratamento de esgoto de Maragogi. Sinceramente, não é o meu assunto favorito, prefiro exaltar as nossas belezas naturais, mas, infelizmente, temos de pôr o dedo na ferida e mais: cauterizá-la.
Leia e perceba o quanto o tema é atual. Cinco anos depois nada, ou quase nada, foi feito pelo poder público, nas três esferas de governo, para solucionar o problema. Curtos três quilômetros de praia urbana continuam a receber os efluentes sem tratamento. É de se aplaudir, no entanto, a determinação da Associação do Trade Turístico de Maragogi e Japaratinga (Ahmaja) que passou a cobrar providências aos órgãos competentes. No Dia Internacional da Água, cuidemos, também, do nosso oceano.
Existem, mas não funcionam
Passeava por um hipermercado em Maceió quando me encontrei com um colega corretor de imóveis, recém-egresso de Maragogi e que fora tentar a sorte na Capital. Terno azul impecável, broche da imobiliária no peito e uma queixa a me fazer: “Li sua reportagem na Gazeta de Alagoas sobre os esgotos na praia. Você deveria falar das coisas boas de Maragogi”, contestou.
Aceitei a crítica, mas deixei um comentário: “Se não tratarmos das coisas ruins, cobrando soluções aos órgãos competentes, as coisas boas vão desaparecer”. Ele apertou a minha mão e saiu em busca de clientes dispostos a comprar uma gleba no paraíso chamado Litoral Norte de Alagoas.
Quando cheguei a Maragogi para trabalhar como repórter em 2004, encontrei uma cidade toda removida. As ruas estavam sendo abertas para a instalação do sistema de saneamento básico que deixaria a cidade 100% saneada; a primeira do Brasil a conseguir tal título, gritavam as faixas. Acompanhei as obras, vi botijas serem arrancadas das vias públicas, o transtorno que os serviços causaram, a apreensão e o otimismo dos moradores e empresários do setor turístico com as benesses do investimento, algo em torno de R$ 12 milhões, verba do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), conseguida através do Prodetur.
Eu só não vi, no entanto, depois da obra inaugurada, o esgoto deixar de desaguar na praia urbana da cidade. E comecei a questionar: como uma obra tão cara não tem eficácia? Ouvi desculpas das mais variadas. Corri atrás da verdade. O projeto de saneamento de Maragogi foi elaborado ainda na metade da década de 1990, dentro do Programa “Costa Dourada”, lembra dele? E só foi aprovado no novo milênio. Dessa forma, novas áreas urbanas, que surgiram após a elaboração do projeto, não foram contempladas com a rede de saneamento, a exemplo do Conjunto Tereza Verzeri. Esse foi o primeiro grande erro.
Depois, os tecnocratas do governo e os engenheiros das construtoras ignoraram um dos maiores conjuntos habitacionais de Maragogi, o Adélia Lira, conhecido como “Grota”, onde mora o grosso da população pobre. Para eles, como existia um outro sistema de saneamento supostamente em uso no conjunto, não seria necessário expandir as obras do Prodetur até lá. Esse foi o segundo erro.
O sistema de saneamento que atende à Grota, ou que pelo menos deveria atender, foi instalado pela prefeitura, na década de 1990, com recursos da Fundação Nacional de Saúde (Funasa). Foram gastos R$ 400 mil num projeto que nunca funcionou a contento e encontra-se desativado. O tratamento do esgoto era feito por reatores anaeróbicos, que precisam de pessoas qualificadas para operá-los e nunca as teve.
Ficaram então dois sistemas-apêndices. Eles existem, mas não têm função alguma. O dinheiro foi jogado literalmente na sarjeta. Dinheiro do contribuinte, porque o Estado tem de pagar a quem emprestou. O mais grave do novo sistema de saneamento é que ele traz a falsa impressão de que tudo está bem, quando, na verdade, não está. O esgoto da Grota desce pela galeria de águas pluviais e aflora no mar.
Para agravar ainda mais esse quadro, a população tem de pagar à Casal a taxa de esgoto que é de 60% sobre o consumo de água. A companhia só conseguiu fazer com que 45% das casas beneficiadas com a rede de saneamento se interligassem ao sistema coletor e de tratamento. O alto valor da taxa e a ausência de campanhas educativas contribuem para a baixa adesão.
Felizmente, Maragogi tem aproximadamente 27km de costa e a maior parte das praias está livre da ameaça dos esgotos, mas até quando? A cidade cresce num ritmo acelerado e desordenado, muitas vezes. Chegou a hora de o Ministério Público acionar as empresas e o governo do Estado para que corrijam as falhas deixadas pela implantação do novo sistema de saneamento.
O Poder Público, por sua vez, deveria concentrar forças para angariar recursos no sentindo de ampliar a rede coletora, beneficiando conjuntos e distritos que foram ignorados. Definitivamente, praias sujas não combinam com um destino turístico que pretende se consolidar como um dos mais conhecidos do Brasil.